Contributo para uma visao economica do associativismo religioso--o caso da localizacao das confrarias activas de Lisboa.

AuthorReis Mourão, Paulo
Pages55(20)

Resumem. ¿Donde están ubicadas las parroquias de Lisboa? ¿Qué explica la ubicación de estas parroquias? El presente trabajo, pionero en Portugal, responde a éstas dos preguntas. A través de la validación empírica, usando modelos logit, el artículo identifica como determinantes de la localización de las parroquias, la diversidad humana de las localidades y la tradición de las mismas; el artículo no confirma la hipótesis de la importancia del poder adquisitivo local. Consecuentemente, se confirma que las restricciones de recursos de éste tipo de grupos sociales incluyen la cultura y la traidición en detrimento de la exclusividad de las restricciones de presupuesto.

Palabras clave: economía regional, economía social, comunidades religiosas.

Clasificación JEL: R23, Z12, Z13.

Resumo. Onde se localizam as confrarias em actividade do Patriarcado de Lisboa? Porque se localizam em determinados espaços? O presente trabalho responde a estas duas questões, assumindo-se como um trabalho pioneiro, em Portugal, sobre a temática. Através da validação empírica com recurso a modelos logísticos, as hipóteses de resposta corroboradas identificam como determinantes de localização das confrarias activas em Lisboa a diversidade populacional do espaço (paróquias/freguesias) e a tradição do mesmo espaço, desvalorizando a hipótese do poder de compra associado. Confirma-se, assim, que para este tipo de agrupamentos humanos, a restrição de recursos considera como fundamentais os recursos da riqueza da tradição e do refúgio cultural em detrimento da restrição orçamental exclusiva.

Palavras chave: economia regional, economia social, confrarias.

Classificação JEL: R23, Z12, Z13.

Abstract. Where are the brotherhoods of the Patriarchate of Lisbon? Why are these brotherhoods located in such spaces? The present work answers to these two questions, being a pioneer attempt about the thematic, in Portugal. Through the empirical validation recurring to logit models, this paper identifies as determinants the human diversity of the spaces (parishes) and the related tradition, not confirming the hypothesis of the purchase power of the resident people. Therefore, it is confirmed that the resources constraint of this kind of social groups considers the cultural and the traditional richness as fundamental to the detriment of the exclusive budget restriction.

Key words: regional economics, social economics, religious brotherhoods.

JEL classification: R23, Z12, Z13.

  1. Introdução

    A Economia é a Ciência da Escolha. E o ramo da Economia Social reflecte sobre as escolhas dos grupos, vistos na sua grandeza sociológica. É um ramo relativamente recente que, no entanto, se tem debruçado sobre as escolhas efectuadas pelos agrupamentos humanos em termos de padrões de organizaião (instituições, hábitos e tradições), em termos de disposição de recursos de modo à satisfação de grupos carenciados ou assistidos, em termos do debate da própria dádiva, da racionalidade da pretensa não retribuição material de gestos generosos ou ainda da discussão da terminologia relacionada com "capital social", "redes sociais" e "cooperativismo".

    Nesta emergente e vasta problemática existe o lugar para a discussão da localização de certas práticas associativas entre os indivíduos. Por que motivos alguns espaços apresentam associações ou colectividades florescentes e outros espaços não? Por que razões alguns agrupamentos de indivíduos vigoram em plena actividade e outros grupos equivalentes já cessaram as funções constitutivas? Para um economista, estas questões emergem como a procura de conhecimento sobre as razões que levam os agrupamentos a apresentarem actividade enquanto resultado da escolha racional dos agentes constituintes. Por exemplo, por quê alguns clubes desportivos encerram funções? Neste caso, na maioria dos exemplos, a razão localiza-se na desvantagem entre custos de actividade e respectivos proveitos. Mas alguns exemplos persistem que demonstram que, apesar de elevados passivos orçamentados quando comparados com o valor activo, certos clubes mantêm a actividade. Mais uma vez, porquê? Talvez porque o custo de encerranlento comportaria perda de benefícios futuros compensadores. Mas também porque essa não é a vontade acumulada de dirigentes e associados racionais que avaliam não só o quantitativo contabilístico mas também outros valores, como o simbolismo da instituição colectiva, bens públicos não materializáveis (à senlelhança de um certo orgulho social ou padrões de união) e a relevância da história do grupo.

    Este trabalho reflecte sobre a localização na área geográfica da Grande Lisboa de um tipo de agrupamento humano, de inspiração religiosa e de índole associativista: as confrarias e irmandades. Vocacionadas para a prática de assistência social, funcionaram, desde a Idade Média, como resposta eminentemente local a necessidades primárias dos indivíduos. No entanto, fruto da evolução histórica, estes agrupamentos persistiram, no território português, com uma imagem mais difundida associada às "Misericórdias" que começaram na unidade pioneira de Lisboa, fundada pela Rainha Dona Leonor no Século XV, e que foram espalhadas pelo país. Mas também outras confrarias e irmandades, de acção mais localizada, foram constituídas, persistindo algumas em plena actividade, no início deste Século XXI.

    Sobre todas estas confrarias e irmandades, coloca-se uma observação: muitas, ainda que não dissociadas, ostentam uma existência latente, sem respeito pela actividade pedida nos documentos de constituição ("Compromissos"), enquanto outras remanescem em actividade.

    Este trabalho vai procurar auscultar hipóteses, posteriormente, testadas, que expliquem com a envolvência institucional do espaço a presença (ou não) de confrarias activas no Patriarcado de Lisboa. Para o efeito, após uma consulta bibliográfica apresentada, que discute as marcas evolutivas mais significativas das confrarias de influência portuguesa (quer em Portugal quer no mundo lusófono não-europeu), concluiu-se que as confrarias têm sido, ao longo desta observação temporal, agrupamentos de refúgio cultural nos ambientes de maior diversidade populacional, tendencialmente localizados em espaços centrais, tradicionalmente mais ricos, e caracterizados por um ambiente social promotor de práticas associativistas (sobretudo, até ao Século XIX, debaixo da influência preponderante do espírito caritativo da população cristã).

    Foram usadas assim variáveis das freguesias da NUT III Grande Lisboa (coincidentes com as paróquias do Patriarcado estudado), retiradas da série "Retratos Territoriais", editada pelo Instituto Nacional de Estatística em 2006. Para uma identificação das confrarias em actividade, recorreu-se ao endereço electrónico do próprio Patriarcado.

    Após o teste das hipóteses com recurso a modelos logísticos, confirmou-se, com robustez estatística, que a localização dais actuais confrarias em actividade no Patriarcado lisboeta se justifica eminentemente pela heterogeneidade social e pela tradição associativa dos espaços, deixando-se cair como relevante a possibilidade de a centralidade e o poder de compra dos habitantes poder contribuir para uma explicação mais completa da questão.

    A estrutura do texto que se segue apresenta uma Secção 2 que aponta as características evolutivas mais marcantes das confrarias de influência portuguesa; a Secção 3 enuncia as hipóteses, apresenta as variáveis testadas e discute os resultados dos testes de natureza econométrica propostos. Finalmente, a Secção 4 conclui.

  2. Evolução histórica das confrarias de influência portuguesa

    Inspiradas nos modelos das ordens mendieantes que proliferavam na Europa desde a acção de franciscanos e dominicanos, (1) as Confrarias, Irmandades ou Fraternidades (2) formulavam um compromisso de vida e definiam propósitos de culto ou de assistência social, de acordo com Pinharanda Gomes (1999). Originalmente, quer confrarias, quer irmandades, funcionavam enquanto sociedades de ajuda mútua, onde os associados contribuíam com jóias de entrada e taxas anuais, na explicação de Reis (1997), recebendo, em contrapartida, assistência na condição de doentes, de prisioneiros, de famintos ou de falecimento. Cada confraria, por seu turno, recebe um patrono, destinado a, por um lado, inspirar com o seu traço de vida o exemplo quotidiano dos confrades e, por outro lado, a ser uma ligação com o Divino.

    Dada a predominância laica na constituição dos membros, as Confrarias e as Irmandades podem ser, assim, assinaladas como das mais remotas manifestações de activismo dos leigos cristãos na transformação da realidade envolvente. Em seguida, vão ser esboçados os traços preponderantes de duas estruturas distintas de confrarias: as Misericórdias e as confrarias étnicas.

    2.1. As Misericórdias

    Até ao século XV, a assistência aos mais desvalidos era vista como uma virtude cristã e uma manifestação do mundo cristão na dimensão profana da realidade, numa Europa de forte influência religiosa. Da Leonor, Rainha de Portugal, fortemente influenciada por uma educação piedosa, recorreu às Obras de Misericórdia Cristã. (3) de modo a instituir uma acção que, dada a sua projecção política enquanto monarca, pudesse ultrapassar os eircunstancialismos de espaço e de preservação temporal que as tradicionais confrarias laicas herdadas da Alta Idade Média padeciam. Estas instituições herdadas dos séculos XII a XIV assumiam-se através de um cariz muito diversificado: confrarias, irmandades, albergarias, hospitais, gafarias, leprosarias e mercearias. (4) No entanto, muitas tinham um período de actuação curto, dependentes do carisma de líderes locais mobilizadores, da disponibilidade de recursos constituídos e da presença de colaboradores. Adicionahnente, a sua acção era concentrada em determinado sector de carências populacionais (como doenças específicas, à semelhança da lepra, ou de sub-nutrição, com as mercearias caritativas) assim como com uma oferta de serviços de reduzido raio espacial. Havia...

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